Estela São Martinho tem 42 anos e é atleta do OCS Arrábida Trail Team. Especialista no Trail, já representou Portugal no Mundial de Skyrunning disputado em Vouzela.
Adepta das provas longas, já correu em três anos seguidos nos Picos da Europa e ganhou este ano, uma prova por etapas com 220 quilómetros disputada nos Pirinéus.
Estela São Martinho tem 42 anos e é natural de Silvares, concelho do Fundão. Residente em Aires, concelho de Palmela, é fisioterapeuta numa clínica em Setúbal.
O desporto fez sempre parte da sua vida. Jogou futebol na sua terra natal e quando entrou para a Faculdade, praticava ginástica. Estela tinha um irmão emigrante que corria provas de obstáculos. “Foi a forma de nos encontrarmos em Barcelona, em 2017 fizemos uma prova. Descobri então que gostava de correr. Com uma amiga, comecei a treinar”.
Paixão pelo Trail desde a primeira hora
Em 2018, Estela começou a procurar provas de trail. Começou por provas curtas, 12 a 20 quilómetros. O Trail dos Javalis no Parque Natural da Arrábida foi o seu ‘padrinho’. “Ganhei os 18 km, a Organização da prova convidou-me a entrar para a equipa dos ‘Javalis’ de Setúbal. Entrei, hoje a equipa chama-se OCS Arrábida Trail Team”.
Estela ia correndo os trails em Portugal e as provas de obstáculos quando ia ter com o irmão emigrante. “O gosto pelas viagens e montanhas, levou-me a permanecer nesta área”.
“É preciso foco. Treinar é como comer, dormir, trabalhar, estudar”
Todos os dias com atividade desportiva
Hoje, não há dia na semana em que a atividade física não esteja presente. “Faço ginásio, corrida e bicicleta, às vezes descanso um dia. Faço corrida 4/5 vezes por semana, vou uma vez por semana à pista”.
Ester Alves, especialista nas provas de longa distância no trail, é a sua treinadora. Só com muita disciplina é que consegue conciliar a sua atividade profissional com os treinos. “É preciso foco. Treinar é como comer, dormir, trabalhar, estudar”.
Adepta das provas longas
Estela tem nos 100 quilómetros a sua distância preferida. Adepta das provas longas, faz em média, três por ano. Depois, algumas com 20 a 30 quilómetros para ver o ritmo. “Treino muito. Estou os fins de semana sempre fora, o mais alto que consigo. Faço muitos quilómetros em treino. Sou muito competitiva, tenho noção dos meus limites. Não sou boa em velocidade e sou má a rolar”.
No último ano, fez meia dúzia de provas: três curtas, uma de 50 km, duas por etapas sendo uma de três dias e outra de sete dias.
“Como comecei tarde e logo pelo trail, a montanha é tudo para mim, os cheiros, as paisagens, a altitude”
Terceiro ano a correr nos Picos da Europa
Gosta especialmente de provas que tenham alta altitude. “Subir acima dos 2.000 metros. Lá em cima, as coisas veem-se cá para baixo de maneira completamente diferente. Já vou no terceiro ano a correr nos Picos da Europa”.
Já a prova que lhe deixou recordações menos agradáveis foi o Pisão Extreme com 65 quilómetros e 6.800 m de desnível positivo acumulado. “Pela sua dureza, é o estilo de prova que mais me atrai. Mas esta prova foi horrível, não esperava tanta dureza. Mas posso voltar lá para fazer quilómetros, o local é espetacular”.
Estrada sim para treinar
Não sendo adepta das provas de estrada, admite correr um dia a maratona. “Tem de ser bem pensada. Este ano, vou experimentar uma São Silvestre com amigas”.
Para si, a estrada serve para treinar. “Correr na estrada é importante. Como comecei tarde e logo pelo trail, a montanha é tudo para mim, os cheiros, as paisagens, a altitude”.
“Para mim, a alimentação é mais uma disciplina de quem gosta de estar bem, de correr, trabalhar, estudar”
Representar Portugal no Mundial de Skyrunning, momento alto da sua carreira desportiva
Para Estela, o momento mais marcante da sua carreira desportiva tem uma data bem definida, 13 de Abril deste ano. “Na prova de Pisões, consegui ser selecionada para representar a seleção portuguesa no segundo Masters Skyrunning World Championships que decorreu em Vouzela”.
A prova teve a distância de 55 quilómetros e Estela foi a quinta da geral e terceira do escalão. Sagrou-se ainda vice-campeã de Portugal de ultra-sky. Coletivamente, Portugal conquistou a medalha de ouro.
Cuidados com a alimentação e o descanso
Na alimentação, acha-se muito orientada, disciplinada mas muito gulosa. “Para mim, a alimentação é mais uma disciplina de quem gosta de estar bem, de correr, trabalhar, estudar. O descanso é também muito importante, tal como o controlo do peso. Não sou extremista, como de tudo mas com cuidado”.
Não dispensa os exames médicos de rotina e pensa correr enquanto puder. E se não estivesse no atletismo, qual a modalidade escolhida? O ciclismo.
Quanto a lesões, não se queixa muito. “Tenho propensão para tendinopatias dos esquiotibiais. Devido à minha técnica de corrida, estou sujeita a queixas com frequência. Nunca tive outro tipo de lesões”.
“O amador já não é só recreativo, leva a corrida mais a sério. Se não houver acompanhamento e cabeça, aparecem as lesões, deve ter mais cuidado”
Futuro promissor
Estela encara o futuro da modalidade com otimismo. “A corrida em si teve um boom durante e após a pandemia. É uma modalidade fácil de praticar, é fácil de fazê-la sozinho. Por isso, o futuro é longo e promissor”.
Faz ainda uma chamada de atenção para os atletas amadores. “No entanto, o atleta amador quer cada vez mais igualar-se ao atleta profissional. O amador já não é só recreativo, leva a corrida mais a sério. Se não houver acompanhamento e cabeça, aparecem as lesões, deve ter mais cuidado”.
Estela chama ainda a atenção para a falta de controlos antidoping nos atletas amadores.
Companheirismo no mundo das corridas
No mundo das corridas, Estela aprecia particularmente o companheirismo e a partilha. “No meu caso, a experiência na alta montanha. É uma felicidade chegar lá acima”.
“Em Portugal, há que melhorar as marcações nas provas de trail, tal como a segurança dos atletas nos percursos”
Atenção às marcações na provas de trail
A nível organizativo, realça a sua última experiência muito positiva, numa prova por etapas nos Pirinéus. “A logística era espetacular, a alimentação, dormida, as mochilas, a comunicação com os atletas, as aplicações da internet, a segurança dos atletas. Foi do melhor que já vi. Em Portugal, há que melhorar as marcações nas provas de trail, tal como a segurança dos atletas nos percursos”. Chama ainda a atenção para as mortes súbitas, “há pouco controlo sobre a saúde dos atletas”.
“Aconselho todos a correr, seja onde for. É bom para a saúde, bem-estar físico e saúde mental”
Experiência marcante em corrida por etapas nos Pirinéus
Estela correu entre 1 e 8 de Setembro nos Pirinéus. Foi uma prova por etapas bem dura, com 220 quilómetros e 15 mil metros de desnível positivo acumulado. “Formei equipa com Filipa Castela. Ganhámos duas etapas, nas outras fomos sempre segundas. Fomos a equipa mais regular, demorámos 39 horas e ganhámos com cerca de duas horas de vantagem”.
Realça ainda a sua experiência tida com Filipa Castela”: “Passámos 168 horas sempre juntas. Em tanto tempo juntas, seria difícil não haver uma má palavra. Mas nunca houve, foi uma grande partilha”.
Correr no Nepal em 2026
Estela já tem planeadas as suas provas para os próximos dois anos. “Planeei o 2025 tendo em vista o ano de 2026. Nesse ano, quero ir a uma prova por etapas no Nepal. Em 2025, quero fazer o MIUT (115 km na Madeira) e a travessia por etapas dos Alpes suíços”.
Pedido de casamento depois de uma prova na Itália
Quanto a estórias, Estela recorda uma passada em setembro de 2022. “Foi no Tor des Géants, no Vale Aosta, na Itália. Fiz os 144 quilómetros com o meu companheiro Filipe Santos. No dia seguinte às 42 horas juntos a correr, ele pediu-me em casamento”.
Importância do atletismo na vida pessoal de cada um
A terminar, realçou a importância das corridas na vida pessoal dos atletas. “A corrida enriquece-nos em termos pessoais, conhecer pessoas, ter experiências diferentes. O nível de esforço exigido a maratonistas e ultras, dá-nos um estofo diferente. Aconselho todos a correr, seja onde for. É bom para a saúde, bem-estar físico e saúde mental”.
Estela quis ainda fazer um reconhecimento pessoal: “À empresa onde trabalho que reconhece a minha atividade desportiva, facilita-me as coisas. E tem um ginásio que está aberto a todos os colaboradores, fomentando o exercício físico”.