A recente decisão da Federação Portuguesa de Atletismo em criar uma licença obrigatória para quem participar em provas populares, está a levantar grande polémica no seio dos atletas populares e de muitos organizadores de provas. Está já a correr uma petição para a revogação da licença obrigatória que a Federação quer impor aos atletas e organizadores. Eis o seu conteúdo:
Para: Exmo. Senhor Presidente da Federação Portuguesa de Atletismo,
Nós, cidadãos portugueses e praticantes da modalidade de atletismo, subscritores da presente exposição, vimos, por este meio, manifestar a nossa veemente discordância relativamente à decisão da Federação Portuguesa de Atletismo (FPA) de implementar uma licença obrigatória, no valor de 35 euros por época desportiva, ou alternativamente uma taxa por prova entre três a quatro euros, para todos os participantes em competições de atletismo realizadas em território nacional.
Tal medida consubstancia uma barreira económica injustificada à prática desportiva, contrariando princípios constitucionais e legais que regem o acesso ao desporto em Portugal, nomeadamente os consagrados na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto (Lei n.º 5/2007, de 16 de janeiro).
1. Do Direito ao Desporto e da Inexistência de Obrigatoriedade de Filiação
Nos termos do artigo 79.º da Constituição da República Portuguesa, “todos têm direito à cultura física e ao desporto”, incumbindo ao Estado, em articulação com as escolas e associações desportivas, a promoção, estímulo, orientação e apoio à prática e à difusão da cultura física e do desporto.
A Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto reitera esta garantia, determinando no seu artigo 2.º que “todos têm direito à atividade física e desportiva, independentemente da sua condição económica, idade, género ou origem social”, e no artigo 5.º que compete ao Estado, Regiões Autónomas e autarquias locais “promover e garantir o desenvolvimento da atividade desportiva, assegurando o acesso equitativo e não discriminatório à sua prática”.
A imposição de uma licença obrigatória para participar em provas organizadas pela FPA configura uma restrição desproporcionada ao direito fundamental ao desporto, sobretudo quando dirigida a praticantes não filiados que não pretendem estabelecer qualquer vínculo federativo.
2. Do Impacto na Participação dos Atletas Amadores
É amplamente reconhecido que o universo de participantes em provas de atletismo de estrada ou eventos populares é, maioritariamente, composto por atletas amadores, os quais encontram no desporto uma forma de manutenção da saúde, de superação pessoal ou de convívio social, sem qualquer pretensão competitiva formal.
A obrigatoriedade da referida licença representa um encargo financeiro que poderá afastar estes praticantes das provas, produzindo efeitos nefastos, tais como:
Redução da participação em eventos desportivos, comprometendo a sua viabilidade económica e organizativa;
Desincentivo à prática desportiva, em contradição com as metas estabelecidas na Estratégia Nacional para a Promoção da Atividade Física, Saúde e Bem-Estar;
Tendência para a elitização da modalidade, afastando os cidadãos que procuram uma prática acessível e inclusiva.
3. Da Promoção da Atividade Física e da Saúde Pública
A prática desportiva constitui uma prioridade no domínio da saúde pública, sendo amplamente incentivada por organismos nacionais e internacionais, como a Direção-Geral da Saúde e a Organização Mundial da Saúde.
O exercício físico regular é reconhecidamente um fator determinante na prevenção de doenças crónicas (obesidade, diabetes, patologias cardiovasculares), na promoção da saúde mental e na melhoria do bem-estar e da qualidade de vida da população.
Medidas que impõem custos adicionais à prática do desporto de lazer são, neste contexto, contrárias ao interesse público e às políticas de promoção da saúde, contribuindo para o agravamento de desigualdades no acesso à atividade física.
4. Conclusão e Pedido
Em face do exposto, e em nome dos princípios da legalidade, equidade e interesse público, solicitamos a V. Ex.ª que:
Reconsidere, com carácter de urgência, a decisão de implementar uma licença obrigatória para todos os participantes em provas de atletismo, salvaguardando o direito dos atletas amadores à prática desportiva livre e acessível;
Assegure que as provas populares se mantenham abertas à participação de todos os cidadãos, sem imposição de taxas desproporcionadas;
Promova um processo de auscultação pública junto de atletas, organizadores de eventos, associações e demais interessados, com vista à construção de uma solução equilibrada, inclusiva e consentânea com o ordenamento jurídico em vigor.
O atletismo é, por natureza e tradição, uma modalidade de proximidade com as populações, promotora de saúde, integração e superação pessoal. Por isso, não deve ser objeto de entraves que dificultem a sua prática, mas sim de medidas que incentivem e facilitem a sua expansão.
Com elevada consideração,
O Atleta