No Mundial de Belgrado, a Ucrânia com apenas seis atletas do sexo feminino, conquistou duas medalhas, uma de ouro por Yaroslava Mahuchikh no salto em altura e uma de prata por Maryna Bekh-Romanchuk no triplo salto, numa grande manifestação de resiliência e coragem.
Para Bekh-Romanchuk e para milhões de compatriotas, a vida mudou no dia da invasão russa em 24 de Fevereiro.
“Naquela época, eu não pensava em treinar. Eu preocupava-me durante todo o dia com a família, amigos, pessoas queridas e conhecidas. Muitos dos nossos atletas vivem em Sumy ou Kharkiv, as cidades que foram destruídas e arruinadas na sua maioria. Tentei ligar para todos, convidando-os para virem à minha casa ou apenas à minha cidade, pois lá, tínhamos uma situação bastante calma”, lembrou Bekh-Romanchuk.
Mas enquanto a vida na sua cidade natal permaneceu relativamente estável, o marido de Bekh-Romanchuk, Mykhailo, o multicampeão mundial de natação, estava a centenas de quilómetros de distância e não muito longe do epicentro do ataque russo.
“Naquela quinta-feira, eu estava hospedada na minha casa, na cidade de Khmelnytskyi, que fica no oeste da Ucrânia, mas o meu marido teve o seu campo de treino em Brovary, que é a cidade mais próxima de Kiev. Dizer que eu estava stressada é como não dizer nada, pois Brovary estava entre as cidades que estavam a ser bombardeadas nos primeiros minutos desta terrível guerra.
“Sinceramente, nem pensei em recomeçar os treinos. Eu tinha a certeza de que seria impossível continuar a época e, principalmente, atuar no Mundial Indoor. Eu não tinha ideia de como poderia fazer isso, mas a nossa Federação prometeu-nos fazer todo o possível para nos levar a Belgrado.
“Os treinadores principais e seniores da nossa seleção garantiram-me que tinha de continuar a treinar, especialmente se a situação na minha cidade fosse mais ou menos calma. Então, comecei em quatro dias. Certamente que foi muito difícil estar focada no que vinha a fazer mas até consegui fazer algumas boas sessões técnicas”, disse ela.
Bekh-Romanchuk ajustou-se o melhor que pôde às novas realidades que ela e os seus compatriotas enfrentavam e chegou a Belgrado cerca de dez dias antes do início do Campeonato, juntamente com as suas cinco companheiras de equipa.
Ela manteve o seu plano inicial, participando no triplo salto e no salto em comprimento, a única atleta a fazê-lo, ambas as provas no mesmo dia e separadas por poucas horas. Com medalhas mundiais e europeias já conquistadas, Bekh-Romanchuk tem sido uma das melhores saltadoras mundiais no comprimento nas últimas cinco épocas.
Na final do triplo, ela iniciou o seu último salto no oitavo lugar mas conseguiu saltar para a medalha de prata com 14,74 m. Na final do comprimento, Bekh-Romanchuk terminou em sexto lugar com 6,73 m. Ela dedicou depois a sua medalha de prata no triplo ao seu país devastado pela guerra.
“Agora, estou super motivada. Foi a minha primeira competição do triplo salto a nível internacional e tive muita sorte em fazer parte num evento com um recorde mundial e ganhar a prata para o meu país. Dedico esta medalha a todo o povo ucraniano, às forças armadas ucranianas que defendem o nosso país”, disse Bekh-Romanchuk.
A vida nalgumas partes do oeste da Ucrânia pode continuar ainda a ter uma aparência de normalidade. Mas Bekh-Romanchuk está longe de ser imune ao impacto humanitário do conflito. Mais de seis milhões de pessoas foram deslocadas desde a invasão e Bekh-Romanchuk tem desempenhado um papel ativo em ajudar as pessoas a deixar o país, a caminho da segurança através da fronteira ucraniana e para o resto da Europa.
“Depois de um dia, a nossa casa parecia um porto seguro para centenas de pessoas que pretendiam deixar a Ucrânia como refugiadas para países europeus. Eram principalmente mulheres com os seus filhos.
“Ajudámos todas as famílias… estavam todas cansadas e famintas. A minha casa era algo como um centro de voluntários. Sinceramente, ainda é. Mesmo quando estou aqui, as pessoas ainda ficam na minha casa”, disse ela.