Mais comuns do que se imagina, as arritmias cardíacas durante o exercício físico merecem a devida atenção por parte dos corredores. Induzidas por esforço, as arritmias não são raras, porém só ganharam notoriedade nos últimos anos devido a casos de morte súbita de jogadores de futebol. Ainda assim, os médicos têm dificuldade em diagnosticar e tratar essas condições. O problema é que muitas vezes, esses pacientes não apresentam anomalias clínicas evidentes. Diante de uma suspeita, o melhor a fazer é procurar um cardiologista que tenha experiência em desporto.
Quais as características das arritmias que acontecem durante o esforço máximo?
Durante o esforço, hormónios como a adrenalina e a noradrenalina, que promovem uma grande estimulação do coração, com aumento da frequência cardíaca e aumento da tensão arterial, são libertados no organismo. Esta estimulação pode ocasionar o aparecimento de muitas arritmias, benignas ou não, que poderiam não estar presente durante a fase de repouso. No paciente que já tem alguma doença de coronárias, é comum que surjam arritmias de esforço que, às vezes, vêm acompanhadas de dor no peito (conhecida também como “angina”). O surgimento da arritmia no esforço deve ser sempre motivo de uma avaliação médica rigorosa, já que pode agravar-se. A arritmia é uma das principais razões pelas quais é necessário fazer um exame cardiológico e um teste ergométrico antes de iniciar qualquer atividade física.
O que significa Bloqueio Completo do Ramo Esquerdo (BCRE)?
O batimento cardíaco é gerado pela distribuição de um sinal elétrico para todas as células do coração, que depende da existência de um conjunto de nervos que funcionam como fios elétricos. Assim, possuímos dois grandes nervos (ou fios) que se distribuem para o ventrículo direito (ramo direito) ou para o ventrículo esquerdo (ramo esquerdo) – Eis o esquema:
O ramo esquerdo é mais grosso e mais importante que o direito. Quando ocorre um bloqueio (interrupção) dos ramos direito e esquerdo, o coração diminui muito a pulsação ou apresenta uma paragem cardíaca, pois os estímulos elétricos não são mais distribuídos às células dos ventrículos (principais cavidades do coração). Nestes casos, antes que ocorra o bloqueio total, é necessário que o médico indique a colocação de um bypass. Quando não ocorre, o paciente poderá ter uma paragem cardíaca e morte súbita.
Muitas pessoas apresentam bloqueios dos ramos direito ou esquerdo isolados. Deste modo, o estímulo elétrico é distribuído ao músculo cardíaco pelo ramo desobstruído. Às vezes, este fenómeno ocorre em repouso e desaparece com o esforço. Noutros casos, só aparece com o esforço. Quando isto passa a acontecer sempre, deve-se procurar alguma doença cardíaca que possa estar oculta numa avaliação mais superficial. Neste sentido, o bloqueio do ramo esquerdo requer um cuidado maior já que está relacionado com a doença cardíaca mais frequentemente que o bloqueio do ramo direito. Se o paciente apresenta bloqueio de ramo esquerdo ou de ramo direito, provocados por esforço e não se encontra nenhuma outra anormalidade e se o teste ergométrico é normal, poderá ser autorizado para atividades físicas, inclusive competitivas, sendo reavaliado periodicamente.
Quais são as causas das arritmias induzidas por esforço?
Elas podem ocorrer sem nenhum motivo identificável ou na presença de doença cardíaca. Quando não existe nenhuma outra anormalidade do coração, o prognóstico é bom e poderá autorizar-se a atividade física após o tratamento apropriado. As causas mais frequentes das arritmias de esforço são a tensão alta ocasionada pelo esforço e a doença coronária. Estas condições precisam de ser tratadas para permitir ou não, a atividade física. Outro fenómeno comum e importante no atleta é a chamada “miocardite focal”. Esta situação pode ser ocasionada por um processo infecioso devido a um vírus, por exemplo, por fenómenos imunológicos ou por causas não identificadas. Devido a disto, podem ocorrer arritmias induzidas por esforço principalmente após quadros “gripais”. Neste caso, a atividade física deverá ser suspensa, e deve-se realizar uma avaliação cardiológica muito detalhada.
O prolapso da valva mitral também pode ocasionar arritmia?
Sim. A valva mitral separa o ventrículo esquerdo do átrio esquerdo e está submetida a um stresse excessivo durante o esforço. Independentemente da presença de arritmias de esforço, os portadores de prolapso mitral devem seguir uma rigorosa orientação médica. É importante considerar que existem os exercícios proibidos e permitidos nestas condições. Exercícios inadequados podem ocasionar rápida degeneração e lesão avançada da valva.
O problema pode-se complicar?
As arritmias induzidas por esforço evoluem frequentemente para quadros mais graves se não forem eficientemente tratadas. Desta forma, é preciso uma avaliação cardiológica e um tratamento rigoroso que irá determinar se o paciente poderá ou não continuar a atividade física e/ou se é necessário mudar o tipo de esforço realizado. O diagnóstico de arritmia de esforço significa a imediata suspensão da atividade física, seguida de avaliação cardiológica.
Como diagnosticar?
O exame mais apropriado para diagnosticar arritmias induzidas por esforço é o chamado Teste Ergométrico, no qual o paciente realiza um esforço máximo sob supervisão médica, em tapete rolante ou bicicleta ergométricas. Este exame devia ser obrigatório antes do início de qualquer atividade física. Pode-se fazer também a análise conjunta da respiração, com o Teste Ergo-espirométrico. Um outro exame é o chamado Holter – um pequeno aparelho que é ligado ao tórax do paciente com elétrodos adesivos e que permite o registro do eletrocardiograma durante 24 horas. Existe ainda um exame bastante útil neste quadro, o chamado Web-Looper. Trata-se de um aparelho semelhante a um telemóvel ligado com dois elétrodos adesivos ao peito do paciente. Caso a pessoa sinta algum mal-estar durante a atividade física, ele aperta um “botão” e o seu eletrocardiograma é imediatamente transmitido para a Internet, permitindo a imediata avaliação do médico.
Arritmias são impedimentos para atividades físicas?
O primeiro passo é suspender a atividade física até que o quadro seja esclarecido e tratado. Muitas vezes, as arritmias induzidas por esforço dependem de um certo período de repouso com reavaliação posterior e retorno à atividade física se houver o seu desaparecimento. Muitos casos que não apresentam doença cardíaca significativa podem ser curados apenas com medicamentos de uso contínuo. Se o motivo for tensão elevada, o tratamento deve feito com medicamentos adequados. Se for ocasionada por doença coronária ou por doença das valvas cardíacas, elas deverão ser tratadas de forma rigorosa e definitiva. Entretanto, se a arritmia for originada por insuficiência cardíaca, dilatação ou “espessamento” (hipertrofia) do músculo cardíaco, poderá ser necessária a suspensão definitiva da atividade física. Nestes casos, o tratamento depende da interrupção definitiva da atividade física e do implante de bypass ou desfibriladores cardíacos. Em qualquer caso e após o tratamento definitivo da arritmia, o paciente precisa ser reavaliado para determinar qual o tipo e o grau de atividade física que poderá fazer. A título de exemplo, podemos citar alguns pacientes que correm maratonas após terem sido autorizados depois de realizar uma cirurgia de arritmias ou implante de bypass.