Fernando Vilela tem 60 anos e corre pela União Desportiva da Várzea. É atualmente, um dos melhores maratonistas mundiais do seu escalão. Campeão nacional na recente Maratona do Funchal, é recordista nacional do seu escalão com 2h43m38s.
Fernando Vilela tem 60 anos, foi bancário e está reformado. Nascido em Cheires, freguesia de Sanfins do Douro, Alijó, descobriu o mundo das corridas há 12 anos. “A corrida surgiu na minha vida como que um escape para a stressante atividade profissional que exerci ao longo de 35 anos”.
Estreia na Corrida de S. João no Porto
A Corrida de S. João no Porto foi a sua primeira prova , no dia 17 de junho de 2012. Foi uma estreia inesquecível mas não fácil. “ Apesar de ter somente 15 km, foi muito desgastante mas simultaneamente gratificante por tê-la concluído.”
Vilela representa atualmente a União Desportiva de Várzea, clube situado no concelho de Felgueiras.
Dada a sua situação de reformado, não lhe é difícil conciliar os treinos com a sua vida pessoal. Treina seis dias por semana e habitualmente acompanhado. Tem o seu treinador que lhe prepara um plano de treinos específico com maior incidência nas provas de fundo.
Maratona, distância preferida
Participa em média, em 15 provas por ano e as sua preferência vai para as maratonas e ultramaratonas, “embora estas últimas, as tenha colocado de parte, em face da minha idade”.
Vilela já correu 24 maratonas com a estreia a ser em Lisboa. “Foi um evento impressionante para mim”. Mas a que mais gostou de correr foi a Maratona do Porto de 2022, muito especial porque foi lá que conseguiu completar a distância pela primeira vez, em menos de três horas.
Más recordações de Ultramaratona dos Pirinéus espanhóis
Mora nos Pirinéus espanhóis a prova que deixou recordações menos agradáveis ao nosso entrevistado. Foi o Ultra Trail ‘LaCanfrac Canfrac’ na distância de cem quilómetros, onde esteve duas vezes sem conseguir cortar a meta. “A altitude elevadíssima, com o trilho a ultrapassar várias vezes os 3.000 m, a dificuldade extrema e o cansaço acumulado, levaram ao abandono da prova, de mais de 50% dos atletas que nela participaram”.
A deixar o ‘vício’ do trail
Vilela confessa que já foi “viciadíssimo no Trail, concretamente no Trail Ultra”. Mas agora, está mais virado para a estrada. “É chegada a altura de parar com estas loucuras. De quando em vez, faço uns Mini Trail que são os que mais se assemelham às provas de estrada pela velocidade e curta distância dos mesmos. Estou agora numa fase de transição quase em exclusivo para a corrida de estrada”.
Momento marcante na Maratona de Valência
Vilela elege o seu recorde pessoal na última edição da Maratona de Valência como o momento mais marcante da sua carreira desportiva. Os seus 2h43m38s deram-lhe o segundo lugar do escalão M+60 anos.
Vilela ainda se acha com margem de progressão. Muito competitivo, quando corre é para ganhar. “O meu currículo desportivo vem-se tornando cada vez mais parecido com o de um profissional do atletismo de estrada. As minhas marcas nas diversas distâncias vêm melhorando e ainda vislumbro algum espaço para o seu aprimoramento. Começo a ser uma referência no Escalão M60, tanto a nível nacional como internacional. A exigência que eu faço de mim próprio, não abranda e as provas que estão marcadas são para ganhar!”
Rico curriculum desportivo na maratona
Vilela é dono de um rico curriculum desportivo que faz dele, um dos melhores maratonistas mundiais do seu escalão.
Campeão nacional da maratona, venceu em 2023, as Maratonas de Barcelona e do Porto e foi segundo em Valência com recorde nacional. Ocupa atualmente o quinto lugar do ranking mundial da maratona.
Para se ter sucesso, não basta correr
Vilela não dispensa os exames médicos de rotina, “devem tornar-se parte obrigatória do treino e estarem sempre bem presentes na cabeça dos atletas. Eu faço-os periodicamente”.
Tem os devidos cuidados com a alimentação, principalmente quando está a 15 dias de correr uma maratona. “Estes cuidados, aliados a períodos de sono recomendados, fazem também parte da base da pirâmide para os sucessos do atleta”.
Tem sido visitado pelas lesões, principalmente nos seus primeiros cinco anos de corrida. Entretanto, têm vindo a diminuir gradualmente.
Nas corridas, Vilela aprecia particularmente a sadia camaradagem. Pensa correr até a saúde o permitir e se não estivesse no atletismo, teria optado pelo ciclismo de montanha.
Quanto ao futuro da modalidade, prevê um futuro risonho, com cada vez mais provas e mais atletas.
Precisa-se comentadores na TV com conhecimentos nas transmissões em direto das maratonas
Vilela é crítico para quem comenta as maratonas na televisão. “Falo da comunicação social que intervém em direto na transmissão de uma prova. E aqui, refiro-me concretamente à maratona. É necessário comentadores acreditados neste tipo de prova, e bem acompanhados por atletas ou ex-atletas da modalidade. Gente que saiba que um vento frontal de 18 km/hora é um ciclone para o atleta, ou que a subida de uma dezena de metros é uma ladeira, ou o correr num pavimento empedrado é como correr descalço em gravilha, ou que 20⁰ de temperatura são uma sauna para o atleta. Em suma, tem de haver esta sensibilidade quando fazem as reportagens, principalmente quando estas são exibidas em direto. Porque é assim, em meu entender, que se credibiliza a modalidade e se dá o real valor ao atleta”.
Projetos futuros ambiciosos. Um já cumprido
A entrevista foi feita antes da Maratona do Funchal disputada no dia 21 deste mês. Daí que os seus projetos imediatos passassem pela revalidação do título nacional no Funchal. “Mas não antevejo que seja tarefa fácil devido à recuperação em curso de uma costela fraturada”.
Terminada a prova, Vilela conseguiu atingir o seu objetivo principal, vencendo o seu escalão em 2h58m26s. “O tempo realizado não foi famoso. Vários percalços conjugados contribuíram para aquele tempo:
– recuperação da fratura da costela;
– o treino condicionado no último mês;
– não consegui dormir nas duas noites que antecederam a prova, devido ao facto de ter interrompido a toma de um relaxante muscular que fazia para a recuperação da fratura;
– uma queda ao km 15
– o percurso difícil.
Mas…se fosse fácil não era para mim!”
Depois em Abril, outro grande desafio espera por Vilela, a participação na Maratona de Boston. “Até lá, penso estar recuperado fisicamente para bater o meu recorde pessoal”.
Vilela tem outro sonho ambicioso em vista. “Também, não coloco de parte, lutar por um lugar no pódio a nível mundial, na maratona e no meu escalão M60. É uma tarefa hercúlea mas ao meu alcance. Terei ‘somente’ de reduzir o tempo em 4m35s”.
Nos próximos anos, ambiciona ainda correr maratonas nos cinco continentes.
Quando no Ultra Trail do Mont Blanc chocou com o traseiro de um bovino!
Estórias não faltam a Vilela. Esta passou-se no famoso Ultra Trail de Mont Blanc, os 145 km do TDS, numa noite gelada, chuvosa e com nevoeiro muito denso. “Saía eu do posto de abastecimento de Bourg St-Maurice, situado a uma altitude de 2907 m. Estava cansadíssimo e com bastante frio. Era agora chegada uma etapa que principiava com uma descida muito técnica e que exigia de mim, muita concentração. Queria correr para tentar aquecer mas o terreno e as condições meteorológicas não o permitiam. Quando estava já afastado cerca de 1 km, ouvi um ruído estranho que não identifiquei de imediato! Fiquei ainda mais alerta e qual não foi o meu espanto, quando subitamente esbarrei na traseira de um bovino de grande envergadura que por ali pastava serenamente. Ufa! Não ganhei para o susto!”
Estrelas no céu que eram um rebanho de ovelhas no Ultra Trail “Oh Meu Deus!
A outra estória passou-se no Ultra Trail na Serra da Estrela “Oh Meu Deus!”. “Era também de noite mas as condições atmosféricas eram muito agradáveis. Corria juntamente com um grande amigo destas andanças, quando de repente depois de uma curva no trilho, deparámo-nos bem à nossa frente, com dezenas de coisas brilhantes como estrelas no céu! Naquele instante, o nosso instinto foi de parar imediatamente, mas logo compreendemos o que era aquele espetáculo! Era nada mais nada menos, do que um rebanho de ovelhas que se cruzava no nosso caminho e cujos olhos refletiam a luz dos nossos frontais!
Mais atenção aos resultados dos veteranos
A terminar, Vilela deixou a sugestão na divulgação anual dos nomes dos campeões nacionais dos diversos escalões e nas diversas modalidades.
Tendo começado a correr apenas aos 48 anos e com o seu currículum na maratona, até onde poderia ter chegado Fernando Vilela se tem começado a correr enquanto jovem e devidamente acompanhado?