Doha mostra painéis e banners gigantes a promover o Mundial de Atletismo. Apesar de todo o investimento feito pelo governo do Qatar, a população local não se tem mostrado interessada na competição. O número de espetadores nas bancadas tem sido muito baixo para uma lotação de 40 mil espetadores, bem longe do que temos visto noutros Mundiais.
Na terça-feira dia 5, o evento viveu o seu pior dia. O Governo do Qatar acredita que, nos próximos dias, em especial a partir de sexta-feira, haverá mais espetadores no estádio.
Os organizadores do Mundial desculpam-se que nesta terça, houve um outro evento desportivo concorrente ao Mundial. Enquanto decorria o Mundial, cerca de 15 mil qataris foram ao Estádio Jassim Bin Hamad Stadium, também em Doha, assistir à meia-final da Liga dos Campeões Asiáticos entre o Al-Sadd e Al-Hilal, da Arábia Saudita. Mas e nos outros dias em que não houve futebol na cidade?
O Comité Organizador do Mundial salientou que este é o primeiro Mundial de Atletismo no Médio Oriente, acreditando que a realização da competição poderá trazer ao país novos adeptos da modalidade.
Em comunicado divulgado pelo Comité, “Apesar de enfrentarmos desafios únicos como anfitriões, em termos de bloqueio político, permanece a nossa ambição de fazer um grande Mundial. Até ao momento, assistimos a mais de 80 nacionalidades diferentes no estádio, a grande maioria desfrutando do atletismo pela primeira vez. Os atletas que competem no Estádio Internacional Khalifa e os fãs presentes gostaram da experiência”.
A escolha de Doha como sede do Mundial foi polémica. A cidade derrotou as candidaturas favoritas de Barcelona e Eugene. Todo o processo foi alvo de acusações de corrupção, envolvendo inclusive, o presidente do Paris Saint-Germain, Nasser Al-Khelaifi, acusado de “corrupção ativa” na investigação relativa à candidatura de Doha ao Mundial de Atletismo. O processo de candidatura ao Mundial de 2017, quando Doha perdeu para a cidade de Londres, também foi alvo de acusações.
Maioria dos atletas adota um discurso político
A reduzida participação do público no Mundial de Doha parece não ter incomodado muito os grandes nomes do atletismo internacional. Pelo menos em entrevistas, as principais estrelas da competição adotam um tom político quando questionadas sobre o tema. Shelly-Ann Fraser-Pryce, vencedora dos 100 m, foi uma delas. “Nada tira o brilho da competição. Nós atletas, temos que nos focar apenas na pista e eu estou muito feliz de ter vindo a Doha conquistar este título”, disse a jamaicana.
Christian Coleman, campeão dos 100 m, adotou um discurso parecido após ter vencido a final. “É claro que ver um estádio cheio é bem agradável, mas isso não vai tirar o brilho da realização de um Mundial aqui”, disse o norte-americano.
Francês do decatlo é a exceção
O único nome de peso a criticar a realização do Mundial em Doha foi o francês Kevin Mayer, atual campeão mundial e recordista do decatlo. Além de citar as bancadas vazias, o atleta falou ainda sobre a climatização do Estádio Khalifa. “Nós todos, podemos ver que o Mundial é um desastre. Não há ninguém nas bancadas e o calor não foi amenizado. Houve quase 30 desistências na maratona feminina. Isso é triste. É preciso deixar a razão de lado e concentrar-se na paixão, porque se não fosse por isso, eu teria boicotado este Mundial”, disse o francês.
Jornalistas estranham bancadas vazias
Jornalista desportivo há 15 anos, o jamaicano Andre Lowe, do The Gleaner, demonstrou a sua estranheza com a pouca presença de público em Doha. Cobrindo todos os Mundiais in loco desde Daegu 2011, Lowe, que acompanhou de perto toda a carreira de Usain Bolt, deu a sua opinião sobre o evento, fazendo uma ressalva. “ Com certeza que a atmosfera aqui na perspetiva do público, não é tão alegre como em Mundiais passados. Desde 2011, que acompanho o Mundial, e este é com certeza, é o de menor público presente no estádio. Apesar disso, tem pequenas sessões com apoiantes animados. Na final dos 5.000 m, os etíopes fizeram bastante barulho. Os jamaicanos também estavam presentes, como em todo o Mundial”, disse.
Mark Woods, do britânico The Telegraph, cobriu presencialmente outros quatro Mundiais de Atletismo. Para ele, a questão da pouca presença de público em Doha é cultural. “Eu não acho que a falta de um grande nome como Usain Bolt tenha tido impacto na falta de público. Talvez tenha impacto na audiência da TV. Eu acho que a falta de público está ligada ao país. O Qatar tem as suas questões políticas, é uma nação pequena. Mas eu acho que o desporto em si, está enfrentando uma falta de interesse do público”, disse.