Pedro Pichardo inaugurou ontem as Conferências do Forte de Albarquel em Setúbal, antiga fortaleza militar do século XVII recentemente requalificada pela Câmara Municipal de Setúbal.
Em conversa com o conhecido jornalista da televisão e Antena 1, Paulo Sérgio, e perante algumas dezenas de assistentes, Pichardo, dono de uma grande simplicidade, falou dos seus treinos e das competições, das suas aspirações, da sua alimentação, etc.
Eis os temas abordados:
Preparação olímpica em 2020
Mudou muita coisa quando soube do adiamento dos Jogos Olímpicos, inicialmente previstos para 2020. Nesse ano, não houve competições, foi só a treinar, à espera do que acontecesse no ano seguinte, se iria ou não haver Jogos.
Emoções em Tóquio
Em Tóquio sem público, parecia quase um treino, era estranho. A maioria dos atletas fica mais nervosa na qualificação. Eu não, entrei na pista com muita confiança. A tática do meu pai (seu treinador) era fazer só um salto mas cometi um erro e tive de fazer dois saltos. A marca de qualificação não era muito exigente para mim.
No dia da final, já estava mais nervoso. Quando estou muito bem, não olho para os meus adversários. Depende do dia, como estou.
Quando ganhei o ouro, não pensei em mim, pensei na minha mãe e no meu pai. Foi muito importante para a minha carreira.
Mudanças após o ouro em Tóquio
A mida vida mudou muito desde Tóquio. Por exemplo, o tratamento num restaurante foi bem diferente antes e depois de Tóquio. E foi o mesmo empregado que me atendeu.
Quando perde
Quando perco, é difícil de gerir para mim. Foi o que aconteceu na Polónia, na Taça da Europa de Seleções. Só acertei um salto, raramente faço um nulo.
E o quarto lugar no Mundial de Doha, para mim foi o pior lugar. Foi complicado, fui eu que falhei.
Na história do desporto português
Até agora, 2021 foi o meu melhor ano. Faço parte da história do desporto português, é uma grande honra ser um dos cinco atletas com ouro olímpico.
Gostava que Portugal me visse daqui a anos como o melhor atleta português de sempre. Já vou com duas medalhas pelo país. Penso parar a carreira aos 35 anos, ainda tenho muitas competições, acho que vou conseguir.
2022 é para ganhar tudo
O ano de 2022 é para ganhar tudo (Mundiais de pista coberta e ao ar livre e Europeu ao ar livre). A única coisa que me pode impedir de ganhar tudo é estar lesionado, não estar bem fisicamente. A pista de Eugene é a melhor onde já saltei.
Diferenças entre pista coberta e pista ao ar livre
O comprimento do espaço para saltar na pista coberta não é tão grande como ao ar livre. E o público está mais perto, há mais barulho, não deixa concentrar-me tão bem. Mas não faço trabalho específico para a pista coberta, a preparação é a mesma.
Dias de treino
Descanso normalmente ao domingo e à quarta-feira, tenho descanso ativo. Nos outros dias, treino 3/4 horas. O meu pai coloca metas bem complicadas para mim. Não há dias de folga para ele, esteja ou não cansado.
Para o Mundial de pista coberta em Março, a partir de Fevereiro vou diminuir a carga de treino.
Peso ideal e alimentação
Tomo um pequeno-almoço forte, não costumo almoçar. Peso agora quase mais 2 kg do que quando estou em competição. Tenho de ter 69/70 kg.
Já comecei a gostar de peixe, gosto muito de dourada grelhada. Mas ainda não de choco frito.
Recorde mundial
Tenho o objetivo de ser recordista mundial. Gostaria e estou a trabalhar para ser este ano. Como estou a trabalhar, acho que devo conseguir, se tudo correr bem. O recorde mundial de Jonathan Edwards é de 18,29 m mas ele saltou 18,43 com vento. Estou a trabalhar para mais de 18,43 m.
É mais fácil bater o recorde nos meetings da Liga Diamante, há menos pressão. Nos grandes campeonatos, pensa-se mais nas medalhas, é mais difícil aí.
Quando olho para a distância do salto, é diferente ser com roupa de treino ou à ‘civil’, que parece mais longe.
Lesões
Tive uma lesão grave em Cuba, foi a pior fase da minha vida, estive parado 6/7 meses. Foi muito complicado mas tive o apoio da minha mãe e do meu pai.
Razões para escolher a região de Setúbal
Em Lisboa, era muita confusão, complicado para treinar. Quis um local mais calmo. Andei com o meu pai à procura durante dois dias num uber. Escolhi Setúbal. A pista tem as condições necessárias, a Câmara equipou devidamente o ginásio. O Benfica tem-me tratado bem, os problemas foram só no início.
Centro de Alto Rendimento em Setúbal
Podia haver um Centro de Treinos de Alto Rendimento em Setúbal, semelhante ao de Vila Real de Santo António. Antes dos Jogos Olímpicos, a colombiana Caterine Ibarguen esteve a treinar em Setúbal. Vamos a ver se a Câmara aceita a sugestão.
Reconhecimento desportivo em Cuba e Portugal
Em Cuba, não há diferenças no desporto. Aqui, é o futebol, é difícil ser-se reconhecido no atletismo. Não se dá a devida importância à modalidade, devia ser mais apoiada.
Precisam-se mais apoios
Merecemos mais apoios, somos a única modalidade que tem campeões olímpicos. Muitas vezes, são as Câmaras que têm de apoiar os mais jovens.
Treinar e trabalhar é complicado. A parte financeira, é importante para só poder treinar. É preciso descansar depois do treino.
Em Portugal para sempre
Penso ficar cá para sempre. A minha mãe e o meu pai também querem ficar cá. Aqui, é a minha casa. Agradeço à Câmara ter-me dado todas as condições para treinar.
Condecorado com a Grã-Cruz da Ordem do Mérito pelo Presidente da República
Foi muito importante, em Cuba nunca estive com o Presidente. Marcelo foi muito simpático com o meu pai, mais ainda do que comigo. Foi uma emoção muito grande.
Embaixador de Setúbal no Desporto
Pedro Pichardo já tinha sido distinguido, em Março, pela Câmara Municipal de Setúbal, com a Medalha de Honra da Cidade, na Classe Desporto. Foi novamente distinguido pela autarquia após os JO de Tóquio. É embaixador de Setúbal no Desporto e soube agora que é convidado para ir às escolas falar com as crianças, promovendo a modalidade.
Luís Liberato, responsável da Divisão de Desporto da Câmara informou ainda que a autarquia aderiu à Fundação do Desporto, o objetivo é fazer o Centro de Alto Rendimento de Atletismo.
Para ganhar alguma coisa em pista coberta não tem de pelo menos estar federado? Neste momento o atleta não está federado (conforme se verifica através das plataformas FPA Competições e Lince FPA). Só se está inscrito noutra Federação.