Tegla Loroupe, Chefe de Missão da Equipa Olímpica de Refugiados, afirmou que os atletas que decidiram ficar na Europa em vez de regressar ao centro de treinos no Quénia “não podem” competir em Tóquio este ano.
No entanto, os atletas do Sudão do Sul ainda estão esperançados de que possa ser encontrada uma solução que lhes permita estar nos Jogos Olímpicos.
Loroupe, ex-recordista mundial da maratona, também está preocupada com a imagem do projeto depois de alguns atletas terem decidido refugiar-se na Europa.
Loroupe, que liderou uma equipa semelhante nos JO de 2016 no Rio de Janeiro, afirmou: “Sentimo-nos muito mal com os atletas que ficaram na Europa. Eles não podem ir (a Tóquio) porque se lhes der a oportunidade de disputar os Jogos Olímpicos, estará a incentivar mais pessoas a fazer coisas erradas.”
“O que eles fizeram, impediu que outros atletas conseguissem vistos, porque agora ninguém confia nos outros refugiados. Eles não veem que deixam uma imagem muito má. Eles matam a confiança”.
Nos JO do Rio, a equipa de refugiados foi formada por dez atletas (cinco originários do Sudão do Sul, um da Etiópia e dois da República Democrática do Congo e da Síria), que competiram no atletismo, judo e natação.
Loroupe diz que apoiar os atletas que deixaram o Quénia rumo à Europa, selecionando-os para a equipa de refugiados que vai a Tóquio, pode também prejudicar o futuro do projeto, especialmente para os competidores africanos. “Podemos perder alguns dos parceiros, o que não é bom para o projeto e para os próximos atletas”, destacou.
“O governo e as embaixadas também são parceiros, é como se estivesse apenas a brincar com o apoio da nação”.
Os patrocinadores do projeto da equipa de refugiados incluem o Comité Olímpico Internacional, a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas (ACNUR) e os governos da França, Quénia e Qatar.
Ainda esperançado em estar em Tóquio
Um dos atletas que escolheu ficar na Europa é Gai Nyang, especialista dos 800 metros, ainda esperançado em conseguir uma vaga na Equipa de Refugiados de Tóquio.
“Quero uma solução para o impasse que funcione para os refugiados que vivem lá, o povo queniano e o governo queniano”, disse ele à BBC Sport Africa.
“Eu agora, posso correr 800 metros em 1m48s, o que é apenas três segundos abaixo do nível mundial. Os atletas no acampamento da equipa de refugiados nunca são informados de que precisam fazer um tempo oficial (de qualificação), apenas para ‘ir mais rápido’ para ter uma hipótese de ganhar um lugar nos Jogos.
“O sonho de todos os atletas da equipa de refugiados não é apenas ir aos Jogos Olímpicos, mas qualificar-se, alcançando os mínimos exigidos aos atletas regulares. Então, ter uma vida além disso”.
O jovem de 29 anos explicou que decidiu ficar na Alemanha depois de ter lido notícias sobre compatriotas sequestrados na capital do Quénia, Nairobi, e alguns deles repatriados à força para o Sudão do Sul.
Loroupe não acredita que os atletas do Sudão do Sul tivessem algo a temer ao permanecer no centro de treinos de Ngong, perto de Nairobi ou mesmo, ao voltar para casa.
Nyang diz que “sempre será grato ao Quénia por me hospedar”, mas deseja maior conscientização de que a situação dos refugiados é insegura no país que ele tentou que fosse o seu lar.
“Ser refugiado significa coisas diferentes em países diferentes e no Quénia, não existe um ‘contrato’ que diga que uma vez que se está lá por um determinado período de tempo, pode tornar-se um cidadão”, ressaltou.
“Espero um dia ser cidadão alemão, nem sempre refugiado em algum lugar. Aqui na Alemanha, posso falar livremente sobre o presidente do Sudão do Sul, mas não me senti seguro para fazê-lo no Quénia. Tomei a decisão de salvar a minha própria vida antes que fosse tarde demais.”
Outros atletas observados por Loroupe no enorme campo de refugiados de Kakuma, perto da sua casa, na fronteira com o Sudão do Sul, partiram para a Suíça e o Reino Unido.
A decisão dos atletas de ficarem longe do Quénia deixou Loroupe dececionada, pois ela diz que a sua maior conquista não foi como atleta, mas ser “uma das primeiras no desporto a reconhecer a situação dos refugiados”.
Ela também acredita que o projeto da equipa de refugiados pode “produzir líderes” para países afetados por conflitos. Apesar de alguns atletas terem decidido não voltar ao Quénia, os que permaneceram ainda têm a hipótese de fazer da equipa de Loroupe até aos JO de Tóquio.