Teresa Bernardo tem 51 anos, é atleta do Núcleo Sportinguista Leões da Fronteira e descobriu a paixão pelo atletismo há 13 anos. É recordista nacional do escalão F50 da maratona com 3h00m22s. Toda a família, esposo (coordenador da Secção) e dois filhos (atletas), estão ligados à modalidade.
Teresa Bernardo nasceu em Moçambique e reside atualmente na aldeia de S. Sebastião, concelho da Guarda. Prestes a fazer 52 anos (neste mês), Teresa é professora de Física e Química e o atletismo faz parte da sua vida desde 2007, embora só se tenha dedicado mais a sério em 2015, quando se preparou para a sua primeira maratona em Bilbao.
A “culpa” de se ter dedicado ao atletismo radica no nascimento do seu segundo filho. “Três anos mais tarde, em 2007, sentia-me insatisfeita com o meu corpo e decidi que teria que dar resposta a essa preocupação. Assim, comecei por ir ao ginásio e a correr ‘indoor’. Mais tarde, a correr na rua, onde as sensações e os efeitos foram muito melhores e mais eficazes. Na Escola, estava envolvida no projeto ‘Unidos pelo Desporto’, que culminava com uma estafeta de quatro revezamentos, num total de 16 km”.
Em 2009, a sua filha, então com 11 anos, disse-lhe que queria ser atleta. A necessidade de saber mais sobre a modalidade, levou-a a tirar o curso de treinadora, nível 1. Tudo isto foram passos importantes que conduziram à fundação do Núcleo do Sporting Clube de Portugal de Vilar Formoso, «Os Leões da Fronteira» (NSLF), no qual Teresa é atualmente, atleta e treinadora.
“Como diria o Prof. Moniz Pereira, todos os dias, são dias de treino”
Estreia na Corrida do Tejo em 2007
A sua estreia em provas populares foi na edição de 2007 da Corrida do Tejo. “Pensei que queria mais e se fosse possível, melhor, fiz 55 minutos”.
A nossa entrevistada leva as corridas muito a sério. Miguel Simões é o coordenador da Secção e o seu treinador que lhe define um plano de treinos, em função dos objetivos definidos para cada época desportiva. E “como diria o Prof. Moniz Pereira, todos os dias, são dias de treino”.
Não lhe tem sido fácil conciliar o atletismo com a sua vida familiar e profissional. Gosta de treinar de manhã, a maior parte das vezes, pelas 6.45/7.00, “para ficar despachada e treinar sem fadiga física e mental”.
Tem duas distâncias preferidas, os 10 km e a maratona. Adora as provas de corta-mato mas não aprecia as provas de trail. “Sinceramente, não me parecem treinos compatíveis. É uma questão de opções”.
Corre em média, uma dúzia de provas por ano, oito a sério e quatro mais como preparação e de acordo com o plano de treinos. As provas a sério costumam ser os Campeonatos de Corta-Mato Curto e Longo, (Distrital e Nacional), Campeonato Nacional de Estrada, Corrida do Montepio, Corrida do Alva, uma ou duas Meias -Maratonas e uma Maratona.
Provas inesquecíveis
É difícil a Teresa eleger a sua prova favorita. “Quase todas as corridas têm trazido recordações agradáveis”. Mas há sempre umas mais do que outras. Refere a sua primeira maratona em Bilbao, em 2015. “Foi mágico e fez-me querer mais”. Também o Campeonato Nacional de Corta Mato Longo 2017, em Mira, onde foi medalha de bronze. “A minha primeira medalha nacional e inesperada”.
Ainda, a Maratona de Valência. “Ficou-me no coração e repeti e repetirei, sempre que puder, é uma prova maravilhosa e feita a pensar no atleta: percurso, apoiantes, organização (antes, durante e depois da prova), animação e ritmo, pois há sempre alguém com o mesmo pace”. Finalmente, a S. Silvestre dos Olivais, em 2017, quando decidiu fazer a passagem do ano no Alentejo e aproveitou para correr a prova. Acabou por ser segunda, apenas atrás da jovem sportinguista Lília Martins.
“Gostava que o meio fundo e o fundo tivessem mais visibilidade, tivessem um Plano Estratégico Nacional”
E prova a “esquecer”
Aqui, foi fácil a Teresa dizer-nos qual a prova em que gostou menos de participar. Foi a Meia Maratona do Douro, há uns anos e num dia de muito calor, quando a Organização não conseguiu garantir os abastecimentos. “Apesar de correr ao lado do rio Douro, não tínhamos água e fomos abandonados à nossa sorte. Durante o percurso, socorri e ajudei corredores, arranjámos água numa horta, foi difícil chegar à meta e no final da distância, custou ver bombeiros a ‘regarem’ o alcatrão com cisternas de água, quando os atletas não tinham tido abastecimento durante a prova. Nunca mais lá voltei…”
Seis maratonas sempre a melhorar com recorde nacional F50 em Sevilha
Teresa já correu seis maratonas: Bilbao em 2015, Burgos em 2016, Valência em 2017 e 2018, Barcelona em 2018 e Sevilha em 2019. Curiosamente, melhorou o seu recorde pessoal em cada maratona disputada, com realce para a de Sevilha, onde fez 3h00m22s, recorde nacional do escalão F50.
Momento marcante da carreira
Terminar a primeira maratona em Bilbao foi um momento que vai ficar registado na sua memória. “Ver a família a apoiar e ‘puxar’ por mim; as pessoas a dizerem o meu nome como forma de incentivo, ouvir ‘Vamos Valeska’ vezes sem conta ao longo da prova, qualquer coisa como ‘Vamos Miúda’ em Euskera (basco); acabar a maratona e o meu filho estar à minha espera, para me ver entrar na reta da meta, para me dar a mão (ele tinha 10 anos) e passar a meta em 3h32m15s”.
Melhorar os recordes pessoais
Teresa mantém as suas ambições intactas. Algumas delas passam pelo melhoramento do seu recorde pessoal em todas as distâncias, em especial nos 10 km. “Gostava de baixar dos 40 minutos e melhorar o meu recorde pessoal e nacional de F50 na Maratona”.
“Faz-me bem à ‘alma’, sinto-me bem a correr, disfruto com o vento com a sensação de liberdade e de estar ali e não pensar em nada”
Saber “ouvir” o corpo para evitar as lesões
Quanto a lesões, elas não a têm visitado muito. “Nunca tive lesões graves. Tenho o normal: as dores e a luta contra a instalação da mesma, fazemos trabalho de prevenção de lesão e quando persiste, o melhor é abrandar ou parar. Temos que saber ‘ouvir’ o corpo”.
Não dispensa os exames médicos de rotina e quanto à alimentação, come de tudo mas com regras. “Não faço restrições alimentares e como muito. Mas tento fazer uma alimentação equilibrada e, sobretudo, hidratar-me bem”.
Atletismo e só atletismo
Pensa correr enquanto puder. “Faz-me bem à ‘alma’, sinto-me bem a correr, disfruto com o vento, com a sensação de liberdade e de estar ali e não pensar em nada”. Mas… e se não estivesse no atletismo, que modalidade gostaria de ter seguido? Teresa é perentória. “Nenhuma! Nunca fui virada para o desporto, sempre fui magra e nunca praticava desporto, o atletismo aconteceu naturalmente”.
No mundo das corridas, aprecia particularmente a sensação de liberdade, o passeio, o convívio, o desafio e o pós-prova. “Mas, para isto acontecer, é necessário todo um apoio, compreensão, e envolvimento familiar. Durante a prova, eles, família, são o meu motor e no final da prova, constato sempre que sem eles, era impossível”.
O que falta para um futuro mais risonho da modalidade
Teresa tem ideias acerca do futuro que gostava de ver no atletismo. Na sua opinião, o meio fundo e o fundo deviam ter mais visibilidade e ter um plano estratégico nacional. “Os portugueses têm, naturalmente, características físicas para a corrida dessas distâncias, para além de termos História e, excelentes exemplos de atletas que chegaram ao mais alto nível. Os quais, não é, sequer, necessário referir porque são referências do Desporto Nacional e Mundial. O envolvimento dos corredores nesta panóplia de corridas que têm florescido, é indicativo de que as pessoas querem correr e esta mentalidade tem sido sustentada pelas corridas populares. Uma política educativa e desportiva neste sentido, desenvolveria o gosto pela modalidade e consequentemente, o aparecimento de mais, muitos mais atletas com qualidade, mas que deveriam ter o acompanhamento técnico adequado”.
Provas federadas aquém das populares a nível organizativo
Na sua opinião, as provas populares são de modo geral, bem organizadas. Mas nas federadas, “por vezes existem constrangimentos relacionados com o delegar de competências e falta de comunicação e liderança horizontal”.
Treinos na fase de confinamento social
Teresa está em teletrabalho desde o confinamento. “Treino em casa, com plano sem objetivo específico, mais focada na preparação física geral e treino de força”. Mas já começou a treinar no exterior, com umas saídas ao fim de semana para um “longo” ao Domingo.
Difícil o regresso das corridas
Face aos constrangimentos derivados pela pandemia, encara o futuro das corridas com alguma apreensão. Na sua opinião, não vamos ter nos próximos tempos, maratonas e corridas com ajuntamento de pessoas. “Voltarão com mais vontade com a descoberta da vacina. Terão que voltar, com meios de segurança, ao nível do alto rendimento, mais como no ciclismo, tipo contra-relógio, o que compromete a competição e a superação individual”.
Quando partiu 3 minutos depois e ainda foi campeã distrital da Guarda
Quem corre há 13 anos tem de ter estórias curiosas. Esta, passou-se num Campeonato Distrital de Estrada. Teresa atrasou-se três minutos na partida porque tinha estado a acompanhar os jovens atletas que treinava, nas suas provas, aquecimento e retorno à calma. “Quando fui fazer o meu aquecimento, despistei-me e já tinham dado a partida quando me apercebi. Pedi autorização para partir e fiquei muito contente por ter conseguido apanhar os corredores da prova e, ainda, ter sido campeã distrital da AA Guarda”.
Quando é confundida com a Jéssica Augusto
Teresa não percebia a razão por que os corredores populares lhe pediam para tirarem uma foto com ela. Isto passou-se em várias provas. “Suspeitei que andavam a confundir-me com alguém. Até que na Corrida do Montepio (2019), o speaker anunciou que Jéssica Augusto estava a atravessar a estrada. Mas, quem estava a atravessar a estrada era eu. Confirmei, então, as minhas suspeitas”.
Envolvida na Academia de Atletismo – Leões da Fronteira
A terminar, Teresa achou interessante divulgar o projeto em que está envolvida e que passa pela formação da Academia de Atletismo – Leões da Fronteira, à semelhança da Academia de Atletismo do Sporting Clube de Portugal, mas com clubes dos Núcleos Sportinguistas do Distrito da Guarda e outros que queiram integrar. “Neste momento, já estão agregados três clubes (Vilar Formoso, Guarda e Sabugal), aumentámos o número de atletas com gosto pela modalidade e ainda o número de atletas jovens federados e participação, dos mesmos, em provas Distritais e Nacionais”.