Entenda como o seu corpo reage ao stresse causado pelo treino e como poupá-lo a futuras lesões
Muitos atletas lesionam-se em determinadas situações mas outras não. Porquê? A resposta a esta pergunta não é simples. Na teoria de stresse de Hans Seyle, temos três fases de reação. A fase 1 é a de Alerta, na qual o corpo percebe que existe uma agressão e começa a reagir de forma emergencial, o sistema nervoso autónomo ativa reações simpáticas (relacionadas com a adrenalina e cortisol), chamada de reação de luta ou fuga. Na fase 2, a Resistência, começa a haver uma tendência ao reequilíbrio de alguns sistemas com a compensação do sistema parassimpático (relacionado com a libertação de acetilcolina e outras substâncias reguladoras) e finalmente a fase 3, Exaustão, na qual o fator de stresse ao organismo continua presente e assim o corpo fica suscetível a gerar lesões/doenças.
Pode-se questionar o que tem isto a ver com a corrida? Tudo!
O nosso corpo está sempre a sofrer novos estímulos durante os treinos. Este é o princípio de qualquer plano de treinos, em que a variabilidade e o aumento gradual da intensidade, provocam adaptações favoráveis que preparam o corredor para qualquer prova. Quando erramos na dose, o corpo entende como agressão e desgasta-se.
Ris um exemplo prático: duas pessoas vão correr uma prova em piso de terra batida (terreno irregular). Eles treinaram juntos, os treinos eram muito parecidos, exceto num dia da semana em que um priorizava um terreno parecido com o que seria na prova e o outro ia para o ginásio correr no tapete rolante. A prova é de longa distância, uma ultramaratona com quatro etapas. No segundo dia da prova, apesar de os dois se terem preparado muito bem, o segundo corredor, que não estava acostumado à aquele tipo de terreno, começa a sofrer de dores em alguns tendões responsáveis pela estabilização lateral do tornozelo e joelho. Este é o primeiro sinal: dor. Mostrando que está ocorrendo uma agressão ao organismo, à qual ele ainda não está adaptado.
Na hipótese do corredor mal adaptado ao terreno parar de correr, o seu corpo, provavelmente, restabelece a sua homeostase e a hipótese de lesão torne-se muito pequena. Caso continue, ele entrará na fase 3 da Teoria do Stresse, mantendo a agressão ao organismo e provavelmente desenvolvendo realmente uma lesão tendínea.
Casos como este acontecem frequentemente. A explicação para isso não passa pela simples sorte ou azar, o treino específico é importante para todos os desportos. Quem consegue imaginar um atleta do salto com vara treinar sempre com uma vara mais flexível e chegar à competição usando uma mais rígida? O que pode isso trazer? Outro exemplo são os tenistas, especialistas nos tipos de piso, existem alguns que só conseguem ganhar títulos importantes num único tipo de piso.
As análises sobre estas lesões costumam estar erradas, já que as entendemos como um simples acaso, esquecendo situações externas que estão sempre presentes. Às vezes, deixamos de considerar o mais importante: o quanto estamos preparados para passar por uma determinada situação.
Ao forçar demasiado o nosso corpo, para uma adaptação rápida, surgem consequências, nem sempre boas. Uma tendinite é um processo adaptativo como qualquer outro. Em todos os treinos em que forçamos o nosso corpo, ocorrem microlesões musculares e tendíneas, o impacto molda o osso e a cartilagem, mas normalmente estas microlesões cicatrizam rapidamente. Então, o corpo vai-se adaptando se forem respeitados os períodos de repouso e recuperação, com treinos variados e aumento gradual de estímulo.
Já quando estes estímulos superam a tolerância de adaptação, teremos mais microlesões que podem gerar grandes lesões e impedir a resolução dos processos de forma natural.
A conclusão é simples: a adaptação ocorre se respeitarmos o tempo de recuperação e dando um estímulo específico. Não se pode pensar que ao correr nas ruas da cidade, isso nos deixa totalmente preparados para correr em trails.