Aires Pratas é aos 63 anos, um dos melhores veteranos portugueses, raramente falhando o pódio quando participa numa prova. Já correu dos 100 metros à maratona e tem em casa, cerca de 900 troféus.
Aires Pratas tem 63 anos e está reformado. Em jovem, jogava futebol e tinha muita velocidade. Os seus colegas diziam-lhe porque não ia para o atletismo. “Tu corres mais do que a bola!” Decidiu então ir ao CF Os Belenenses e por lá ficou, tinha então 26 anos. Francisco Assis foi o seu primeiro treinador. Começou a treinar para os 800 e 1.500 metros, saltando mais tarde para os 5.000 e 10.000 metros. Sempre fez pista, corta-mato e estrada, tendo-se aqui estreado na Meia Maratona da Nazaré.
“Quando faço uma prova, é sempre com prazer. Seja 100 metros ou lá o que for”
Dos 100 metros à maratona
Aires corre atualmente pelo União Povoense e treina todos os dias, habitualmente só e sem um plano de treinos. Regista todos os treinos e provas em que participa, nunca menos de 40 por ano. Não tem uma distância preferida. “Quando faço uma prova, é sempre com prazer. Seja 100 metros ou lá o que for”.
Já experimentou o trail mas não ficou fan. Foi nas Caldas da Rainha onde ganhou o seu escalão na distância de 25 km. “Gosto muito de atletismo mas prefiro a estrada e a pista”.
Primeira maratona depois de uma noite de trabalho!
Aires já participou em 11 maratonas, tendo desistido em duas. A primeira foi em 1985, organizada pela Associação de Atletismo de Lisboa e começou no Autódromo do Estoril, num percurso de ida e volta ao Guincho. Corria então pelo Centro de Atletismo de Campolide e Januário Costa era o seu treinador.“Estive de serviço toda a noite, era segurança nos Estaleiros Navais da Parry & Son. O treinador foi-me buscar ao trabalho às 8 h da manhã. Aos 35 km, deu-me uma enorme fraqueza, pedi uma pera à minha mulher. Senti-me depois bem, foi sempre a andar”.
Fez então 2h35m que ainda hoje se mantém como recorde pessoal na distância, tendo corrido a última em 2013, no tempo de 2h59m35s. Todas as nove maratonas que completou, fê-las em menos de três horas.
“Sempre fui naturalmente rápido, não faço treino específico para as provas de pista”
Nos Campeonatos de Veteranos
Aires nunca deixou a pista e participa regularmente nos 400, 800, 1.500 e 5.000 metros dos Nacionais de Veteranos na Pista Coberta e ao Ar Livre. Não faz nenhuma preparação especial para estas provas. “Sempre fui naturalmente rápido, não faço treino específico para estas provas”.
Em 1996, esteve presente no Europeu na Suécia, tendo participado na maratona (7º da geral e 4º do escalão) e 3.000 metros (8º). Esteve mais tarde no Europeu de Pista Coberta, também na Suécia.
Em 2016, participou no Europeu realizado no Algarve, tendo saído de lá com uma medalha de ouro (estafeta) e duas medalhas de prata (meia maratona e 10.000 m por seleções). Foi ainda 5º individual nos 10.000 metros.
“Não temos agora atletas que sobressaiam. Não têm espírito de sacrifício”
A caminho do milhar de troféus
Rara é a prova em que Aires não sobe ao pódio. Não sabe o número certo mas estima que deva ter em casa, à volta de 900 troféus. E medalhas, não faz ideia, estão guardadas em vários caixotes.
Pensa correr enquanto tiver forças. “Não vai ser fácil acabar já”. Não dispensa os exames médicos de rotina e quanto a lesões, a mais grave foi no ano passado, na Corrida Farmacêutica. Ainda acabou a prova, agravando o problema, tendo sido depois operado ao menisco.
Inscrições nas provas estão caras
Na opinião de Aires, as inscrições nas provas estão a ficar muito caras. Aprecia particularmente o convívio com os outros atletas e os seus projetos futuros são muito fáceis de definir: treinar e correr. Se não estivesse no atletismo, tinha optado pelo futebol, sua modalidade inicial.
Vê o futuro da modalidade com algum pessimismo. “Não temos agora atletas que sobressaiam. Não têm espírito de sacrifício. Ganham as provas até aos juniores, depois perdem quando chegam a seniores e desistem”.
Quando aos 26 anos já era velho para começar a correr!
Estórias não faltam ao nosso entrevistado. A primeira que nos relata acabou por significar o momento mais marcante da sua carreira desportiva. “Quando apareci no Belenenses, dirigi-me à Secção de Atletismo. O seccionista, senhor João Félix, mandou-me ir ter com um treinador que por respeito, não digo o nome. Ele perguntou-me que idade tinha e quando lhe respondi que eram 26, respondeu-me muito rapidamente que aos 26 anos já era velho para o atletismo! Isto passou-se na parte sul da pista, na parte norte estava outro treinador que era o professor Francisco Assis. Entre um e outro local, fui falando sozinho, como o primeiro treinador me tinha dito que era velho para o atletismo, pensei em mostrar-lhe que a sua teoria estava errada. E passados 37 anos, ainda cá estou”.
Aos coelhos em Monsanto
Outra estória passou-se com o seu treinador Francisco Assis. “Quando fazíamos treinos longos, íamos correr para Monsanto. Assis ficava na pista a treinar outros atletas e quando regressávamos à pista, ele tinha o hábito de só medir a pulsação a mim. Um belo dia, lá fomos uns dez para Monsanto mas o nosso treino foi andar atrás dos coelhos. Quando regressámos à pista, mediu-me a pulsação e disse logo aos outros: vocês hoje andaram a brincar, o Aires não vem cansado!”.
Autocarro atrasado para uma prova
Esta passou-se quando Aires foi correr a Vermoil. “Íamos atrasados mas como eu conhecia o caminho, mandei parar o autocarro e saí. Fiz assim o aquecimento até ao local de partida, foi só colocar o dorsal e começar a prova”.
Aguardente na véspera de uma prova
Finalmente, a última estória que tem apenas três anos. “Fomos na véspera para correr os 20 km de Almograve-Zambujeira do Mar. No final do jantar, o dono do restaurante ofereceu uma aguardente a todos os atletas. Alguns não quiserem beber mas eu bebi a minha. Começaram logo a dizer “amanhã, estás bonito!’. Fiz uma grande corrida”.