Inês João tem 37 anos e corre pelo Saca Trilhos Anadia. O desporto sempre fez parte da sua vida mas só começou a correr há apenas quatro anos. Apresenta já um curriculum apreciável no trail.
Inês João nasceu em Coimbra mas vive na Anadia, tem 37 anos e é Engenheira Civil, exercendo a função de Diretora de Obra.
O desporto sempre fez parte da sua vida, em boa parte por influência familiar. “Lembro-me desde sempre do tema de conversa, lá em casa, estar sempre ligado ao atletismo, de ver tudo o que era programas desportivos na televisão e haver sempre jornais e revistas desportivas lá por casa. O meu pai foi assinante da Revista Atletismo até esta ter finalizado as suas edições em papel, tem todas as edições, desde a nº1”.
Ainda em criança, começou cedo a participar em provas de corta-mato e de orientação pedestre, modalidade ainda praticada pelos seus pais. Mas aos 11 anos, optou pelo basquetebol e passou a representar o Anadia Futebol Clube, clube da terra onde reside. Esteve ainda no Grupo Desportivo da Gafanha e no Sangalhos Desporto Clube e chegou a representar a seleção regional de Aveiro.
“Foi aos 35 anos, que comecei a ter objetivos mais concretos ao nível da corrida”
Do basquetebol à estreia num trail, logo com um segundo lugar!
Deixou o basquetebol aos 30 anos mas não abandonou a atividade desportiva. Passou a ser freguesa do ginásio e a dar umas corriditas. O “bichinho” da competição não a largava e três anos depois, aí estava a Inês a estrear-se no Luso Trail Bussaco (17 Maio 2015). Foi uma estreia de sonho que a deixou muito surpreendida, pois classificou-se em segundo lugar da geral feminina.
A sua estreia na estrada foi em 12 de Junho do ano seguinte, na Meia Maratona da Figueira da Foz. Depois no ano seguinte, decidiu participar na Meia Maratona do Douro Vinhateiro, onde sem grandes treinos, fez 1h45m. Decidiu então pedir um plano de treinos ao seu pai Albano João. “Portanto, digamos que foi a partir daí, aos 35 anos, que comecei a ter objetivos mais concretos ao nível da corrida”
“Para mim, o meu pai é o melhor treinador que alguma vez poderia ter”
Atleta e diretora do Saca Trilhos Anadia
Inês João é atleta e diretora do Saca Trilhos Anadia, clube que ajudou a fundar em 2016 e já tem 120 sócios.
É treinada pelo seu pai. “Para mim, o melhor treinador que alguma vez poderia ter”. Treina cinco a seis vezes por semana quando participa nas competições da Associação de Trail Running de Portugal.
Dada a sua atividade profissional (diretora de obra), não tem sido fácil conciliar o atletismo com a sua atividade profissional. “Tenho de andar sempre em viagem, de norte a sul do país, acabo por chegar um pouco tarde a casa. Torna-se bastante desgastante e nem sempre chegamos ao final do dia com energia e disposição para treinar, principalmente quando chega o frio e a chuva. Claro que sempre que possível, tenho a companhia dos meus colegas de equipa, que me ajudam bastante”.
Até finais de Outubro, participou em 17 provas, o máximo que fez num só ano. Fez provas de estrada com distâncias entre os 10 km e a meia maratona e provas de trail, entre os 15 e os 37 km. Nos dois anos anteriores, correu uma média de nove provas, sendo a distância maior de 21 km.
“Na minha opinião, as provas de estrada dão uma grande preparação para as de trail”
Preferência pelo Trail
Inês não esconde a sua preferência pelo trail, “na medida em que alia a corrida com a natureza”.
Na sua opinião, as principais diferenças entre o trail e a estrada, estão no companheirismo existente no trail. “As corridas de estrada são muito rápidas, mas têm o encanto de haver mais público, é muito motivante quando vamos a correr e ouvimos alguém a incentivar-nos”.
Já quanto ao trail, “quando participamos com intuito menos competitivo ou nos treinos, conseguimos percorrer trilhos fantásticos e vislumbrar paisagens lindíssimas, o nosso país é lindo”.
Ainda assim, diz-nos que os dois tipos de provas se complementam. “Na minha opinião, as provas de estrada dão uma grande preparação para as de trail”.
Época de sonho
Inês tem tido este ano, uma progressão surpreendente, dado dedicar-se a sério à competição há escassos dois anos. Venceu várias provas do Circuito Nacional de Trail: Piodão Trail Running (25 km), Trail de Conímbriga Terras de Sicó (25 km) e Duratrail (34 km).
No Trail Serra D’Arga, prova para apurar a campeã nacional de trail da época 2018/2019, obteve um quarto lugar.
Venceu o Ultra Sanabria by Stages 42 km, prova disputada em Espanha, por etapas em três dias. Venceu o “Troféu de Trail Terras de Águeda”, composto por cinco provas no distrito de Águeda (ADT Travassô, LAAC Trail, Bela Bela, Alfusqueiro Trail e Corrida Noturna Cidade de Águeda).
Na Meia Maratona do Douro Vinhateiro, bateu o record pessoal na distância com 1h30m45s, sendo 5ª em Vet. 35.
“Os atletas com talento devem ter as condições necessárias para que esta seja a sua profissão”
As provas mais e menos agradáveis
A distância preferida de Inês passa pelos 25 km. Até agora, a distância maior em que já participou foram os 35 km do Grande Trail Serra D’Arga.
Na estrada, a sua prova preferida é a Meia Maratona do Douro Vinhateiro. “É uma prova linda, com bastante público”. No trail, guarda as melhores recordações do Grande Trail Serra D’Arga e da Ultra Sanabria by Stages, em Espanha.
Quando lhe perguntámos qual a prova em que menos gostou de participar, deu-nos uma resposta curiosa: “Eu adoro correr, não sei se consigo dizer que houve alguma prova que não tivesse gostado de participar. Mas o trail que menos prazer me deu correr, foi um em que o percurso era só lama, parecia que estávamos num pântano”.
Momentos marcantes na carreira
Elege dois. Na Estrada, a Meia Maratona do Douro Vinhateiro deste ano, na qual bateu o seu record pessoal. No Trail, a prova de 37 km do Grande Trail Serra D’Arga, que apurou a campeã nacional de Trail. “Embora não tivesse efetuado o Circuito Nacional para me conseguir apurar para a mesma, decidi participar a fim de me testar comparativamente às melhores a nível nacional”. Foi a prova mais longa e aquela onde mais ‘sofreu’ pois esteve doente nos oito dias anteriores. “Tomei uma serie de medicamentos, não consegui treinar nem comer e dormir, praticamente. Mas decidi ir, pois a motivação para correr ao lado de grandes referências nacionais era muita. Consegui um 4º lugar na geral feminina, fiquei a um lugar do pódio. Não estava à espera, caíram-me as lágrimas no final, pois foi a prova em que mais tive de me superar até hoje”.
“A nossa cultura no geral está muito virada apenas para o futebol”
Correr até sempre, mesmo de bengala
Ganho o vício da corrida, Inês João não se imagina de outra forma que não seja a correr. “Vai ser até conseguir, nem que seja com uma bengala”.
Não dispensa anualmente os exames médicos de rotina e quanto a lesões, já foi visitada várias vezes por elas. Mas nada de grave, uns pés torcidos, uma tendinite e micro roturas musculares.
Na terra do leitão e do espumante…
Tem os devidos cuidados com a alimentação, estando a ser seguida por um nutricionista. “Mas nunca tive uma alimentação específica para determinado fim, sempre comi normalmente, sem grandes restrições, até porque Anadia, capital da Bairrada é terra de boa comida e boa bebida, nomeadamente o leitão e o espumante. Ou seja, é impossível ceder a estas tentações. Para além do mais, tenho uma família enorme em todos os aspetos, em que privilegiamos o convívio à mesa.
Falta experimentar o salto com vara
Ao longo da sua vida, Inês tem praticado as modalidades que lhe agradam, orientação, basquetebol, corrida de estrada e trail. Mas falta-lhe experimentar uma especialidade no atletismo que lhe desperta muita curiosidade, “pela sua questão técnica e beleza, o salto com vara”. Ainda vai a tempo!
Atletismo nacional em crise
Na sua opinião, o atletismo nacional está em crise, devido principalmente à falta de apoios. “Os atletas com talento devem ter as condições necessárias para que esta seja a sua profissão, a fim de poderem evoluir e tornarem-se atletas de elite. Em Portugal o futebol rouba sem dúvida o protagonismo das outras modalidades, a nossa cultura no geral está muito virada apenas para o futebol”.
“As pessoas do desporto normalmente são pessoas menos egoístas, mais positivas e lutadoras”
Sentimento de superação
O que mais fascina Inês no mundo das corridas é o sentimento de superação, “quando nos propomos alcançar um objetivo e conseguimos atingi-lo”. E complementa: “É uma modalidade que pode ser praticada por qualquer pessoa, desde crianças a idosos, claro que de acordo com a capacidade de cada um”.
Falta uma Federação de Trail
Inês considera que o Trail deveria ser uma modalidade oficial com a sua Federação própria, “bem regulamentada onde a informação fosse transparente para toda a gente”.
Já quanto a uma melhor organização das provas, chama a atenção para a preocupação em efetuar bons percursos e uma sinalização adequada. Também o preço das inscrições deve ser ajustado à qualidade da prova.
Projetos futuros na modalidade
O grande objetivo de Inês para esta época passa pela sua participação no Campeonato Nacional de Trail, onde espera obter um lugar no pódio. Ainda que não no imediato, pensa ainda correr uma maratona de estrada.
“O desporto modifica as pessoas, torna-nos melhores seres humanos, dá-nos mais disciplina e ajuda-nos a gerir melhor o tempo”
Sandes de leitão e espumante no 1º Trail da Anadia
Outro objetivo para 2020 passa por ajudar o seu clube na organização do “1º Trail Anadia Capital do Espumante”, marcado para 28 de Junho. “Claro que não vai faltar a bela sandes de leitão e o fantástico espumante da Bairrada, estamos bastante empenhados em fazer um bom trabalho e entusiasmados com a prova”.
Chamada inesperada ao pódio no primeiro trail
Quanto a estórias, Inês conta-nos duas. A primeira passou-se na sua estreia no mundo do trail. Foi no Luso Trail Bussaco. “Acabei a prova sem ter muita noção do lugar em que terminei. Fui tomar banho e quando estava a sair do pavilhão de chinelos, vem o meu pai a correr, a dizer que me estavam a chamar para ir ao pódio. Eu pensava que era uma piada, mas pela cara dele, percebi que não e lá fui eu a correr com o saco às costas…fiquei em 2º lugar geral feminina. Não estava mesmo nada à espera”.
“Facilmente identificamos, ao longo da nossa vida, tanto estudantil como profissional, as pessoas que vivenciaram o meio desportivo”
Esqueceu-se do chip mas ainda foi a tempo de não se “esquecer” de vencer
A outra estória passou-se numa prova vizinha, no Trail Bela Bela. “ Estava eu na linha da partida preparadíssima para iniciar a prova, quando olho para baixo e vejo todos os atletas com o chip nas sapatilhas, menos eu. Tinha-me esquecido de colocá-lo, faltavam cerca de três minutos para começar a prova. Fui a correr ao carro para o ir buscar e quando regressei, estava o pessoal todo já a partir. Acabei por vencer a prova”.
Papel social do desporto no dia a dia
A terminar, Inês João exprimiu a sua opinião sobre a importância do desporto na sociedade. “Penso que o desporto modifica as pessoas, torna-nos melhores seres humanos, dá-nos mais disciplina e ajuda-nos a gerir melhor o tempo.
As amizades que fiz ao longo destes anos todos que pratiquei desporto, são muito gratificantes. Criamos um espírito de companheirismo e entreajuda, que só quem passa por este meio, compreende.
Prepara-nos sem dúvida para o futuro, principalmente profissional. Costumo dizer que facilmente identificamos, ao longo da nossa vida, tanto estudantil como profissional, as pessoas que vivenciaram o meio desportivo, o convívio dos balneários, o ambiente pré e pós competição, os festejos da vitória e o erguer-se depois de uma derrota. Normalmente são pessoas menos egoístas, mais positivas e lutadoras”.