Texto: Fernando Beltrami
Perceba as mudanças que ocorrem com o passar dos anos e como elas afetam os seus resultados.
O envelhecimento está associado a uma série de mudanças estruturais e funcionais no organismo, que se refletem diretamente na performance física. No entanto, um pouco menos óbvia do que estas mudanças, é a maneira como o envelhecimento afeta a forma de encarar o treino. A partir de uma determinada idade, dependendo do histórico de treino da pessoa, o organismo não tolera mais a mesma carga de treinos, e passa a exigir períodos mais longos de recuperação entre uma e outra sessão.
Declínio físico
Uma das alterações mais notáveis com o passar dos anos, são as mudanças na composição corporal. Independente de manterem o nível de treino, as pessoas começam a perder massa muscular a partir dos 35 anos, e este declínio intensifica-se a partir dos 45 anos, sendo mais acentuado nos homens do que nas mulheres. Além disso, há o acumular de gordura corporal, o que acentua a perda de massa magra percentual.
Estas perdas são o resultado da soma entre um efeito “natural” da idade, somado ao
típico declínio nos níveis de atividade física que ocorre nesta idade.
O sistema cardiovascular também experimenta a perda de capacidade com o passar dos anos. A frequência cardíaca máxima diminui cerca de um batimento por ano, e a “potência” dos batimentos cardíacos também cai, apesar de em menor proporção, fazendo com que o volume de sangue bombeado pelo coração, por minuto, dimi – nua consideravelmente com o passar dos anos. Com menos sangue circulante, menos oxigénio é disponibilizado para os músculos durante o exercício.
Efeitos sobre a performance
Do ponto de vista fisiológico, a performance em provas de longa duração é em
função do consumo máximo de oxigénio, da fração deste máximo que o corredor consegue sustentar durante a prova e da sua economia de corrida.
Destes três fatores, o declínio do consumo máximo, é de longe o principal responsável pelo declínio de performance decorrente do envelhecimento. Estudos acompanhando corredores veteranos por longos períodos (dez anos ou mais) não encontraram diferenças na economia de corrida destes corredores ao longo do tempo, e também não verificaram diferenças no limiar de lactato (um indicador da fração do consumo máximo que pode ser sustentada numa prova). Estima-se que o consumo máximo de oxigénio caia a uma taxa aproximada de 1% ao ano, já a partir dos 20 e poucos anos.
Além disso, já que existe um declínio natural do rendimento, a simples tentativa de manter uma mesma performance ao longo dos anos, pode transformar um corredor amador desconhecido num atleta de elite para o seu escalão etário.
Nas diferentes faixas etárias do recorde mundial máster na maratona, tanto para
homens como para mulheres, existe um declínio suave de performance, entre os 35 e 50 anos, que acelera de ritmo até aos 80 e depois disso aumenta exponencialmente.
Claro, conforme avançamos na idade há cada vez menos pessoas treinando para alcançar um recorde, o que afeta a qualidade dos dados que estamos usando, mas, por outro lado, há menos pessoas treinando porque as outras muitas vezes já não têm mais condições para se preparar!
Para explicar o problema dessa performance relativa, vamos usar como exemplo
uma corredora de 35 anos; para ela, 4 horas na maratona significa uma marca cerca de 42% mais lenta que o recorde mundial. Esta mesma corredora, se seguir treinando até
aos seus 55 anos e tentar fazer a mesma marca, vai estar correndo apenas 29% mais lento que o recorde mundial para a sua faixa etária! Proporcionalmente, ela será uma corredora muito melhor!
Efeitos sobre o treino
De maneira geral, os indivíduos de idade avançada respondem ao treino de forma semelhante aos indivíduos mais jovens, apesar de possuírem um “tecto” mais baixo para
as suas adaptações. Apesar disso, é preciso levar em consideração alguns aspetos, como
por exemplo, o tempo de recuperação entre as sessões e a carga relativa de um determinado esforço. Além disso, é preciso considerar se um indivíduo está vindo de um
histórico de treinos mais fortes ou se ele está “avançando” na sua preparação.
Um indivíduo que treinou desde a puberdade pode chegar aos 50 e poucos anos, correndo uma maratona em quatro horas, já longe do seu auge. Da mesma forma, ele poderia ter chegado ao mesmo resultado tendo começado a correr com trinta e poucos anos e sendo as 4 horas na maratona, aos cinquenta e poucos, a sua melhor marca de sempre. Apesar do mesmo resultado alvo e idade, estas duas “versões” da mesma pessoa, possivelmente dar-se-iam melhor com planos de treinos diferentes para atingir o seu objetivo.
Ajustes nas cargas de treino
Um mesmo objetivo pode ser conquistado de diferentes formas. Assim, a idade do corredor deve ser levada em consideração para ajustar fatores como o volume, a frequência e a intensidade das sessões de treino.
Enquanto é uma realidade que para correr uma maratona na casa das 4 horas, um corredor precisa de ser capaz de fazer uma meia maratona em aproximadamente 1h50m, este objetivo pode ser atingido com um pouco mais de volume e menos intensidade, ou o contrário.
Com a idade, a quantidade de treinos de mais intensidade deve diminuir, ou ser realizada em blocos separados dos períodos de ganho de volume. Treinos intensos podem ser reduzidos para até uma vez por semana, mas não menos. Estímulos de intensidade apenas a cada 10/15 dias ficam muito desconexos, e a resposta adaptativa é quase nula.
Uma possibilidade mais apropriada neste caso, seria diminuir a quantidade de séries
intervaladas, por exemplo para uma ou duas séries de 1 km, ao invés de quatro ou seis por sessão. De resto, o volume de treino e os ritmos de rodagens e outros treinos mais leves são em grande parte definidos pelo objetivo de prova e pelo histórico do corredor.
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