Quatro atletas portuguesas estiveram em grande destaque no Mundial disputado em Gotemburgo de 1995. Faz agora 25 anos que Manuela Machado, Fernanda Ribeiro e Carla Sacramento conquistaram duas medalhas de ouro, uma de prata e uma de bronze.
No dia 9 de Agosto, Fernanda Ribeiro ganhou uma medalha de ouro nos 10.000 metros. Como recordar é viver, reproduzimos o texto então publicado na edição de Setembro pela Revista Atletismo.
Fernanda imparável derrota olímpica Tulu
A sul-africana Elana Meyer só aguentou oito quilómetros e foi a campeã olímpica Derartu Tulu quem mais trabalho deu à campeã europeia, a qual puxou cinco quilómetros mas terminou fortíssima, no melhor tempo mundial do ano (31.04,99)
Três atletas lideraram quase toda a prova: a inglesa McColgan inicialmente (mas em andamento muito lento, para 32.30 finais); a sul-africana Elana Meyer dos 3.000 aos 5.000 metros (em ritmo de três minutos o quilómetro); Fernanda Ribeiro na segunda metade. Foi Elana Meyer quem “abriu as hostilidades” aos 3.000 m, passando para a frente e alterando o andamento d mais de 76 segundos por volta para 72, com uma volta em 69,55!
Nessa altura, a queniana Tecla Loroupe e a etíope Derartu Tulu, que iniciaram a prova nos últimos lugares, encontravam-se a meio do pelotão e, surpreendidas, não conseguiram seguir Meyer e Fernanda. Ao longo de dois quilómetros, tentaram aproximar-se mas só o viriam a conseguir aos 5.000 metros, quando Fernanda Ribeiro passou para a frente e o andamento se tornou um pouco mais lento. O prof. João Campos confessaria, no final da prova, ter errado ao não mandar Fernanda Ribeiro ajudar Elana Meyer nessa altura, de forma a não permitir a recuperação de Tulu (e Loroupe). É que a etíope, campeã olímpica mas parada por lesão depois disso, confirmou-se como a adversária mais perigosa. A dois quilómetros da meta, Elana Meyer, exausta, ficou para trás e acabaria apenas quinta, 27 segundos depois de Fernanda Ribeiro. Tecla Loroupe, vencedora da Maratona de Nova Iorque (e menos perigosa numa ponta final), cedeu a 500 metros da meta. Derauru Tulu, essa, manteve intenso despique com Fernanda… até à reta final. Atacou na reta oposta, Fernanda aguentou e. nos últimos cem metros, a portuguesa esteve mesmo imparável. Não deu quaisquer hipóteses e colocou-se desde já como a grande favorita para os 10.000 metros olímpicos do próximo ano…
Conceição bem…zinho. Albertina mal
Portugal foi o único país a meter três atletas na final. Na manhã do segundo dia de provas, Fernanda Ribeiro (que até ganhou a meia-final) e Albertina Dias (quinta) classificaram-se sem problemas. Numa primeira meia-final mais rápida, Conceição Ferreira não aguentou o andamento, foi apenas 10ª mas acabou por ser uma das quatro “repescadas” por tempos, para além das oito primeiras de cada série. Confirmava que estava longe da forma de um ano antes, quando foi vice-campeã europeia.
Na final, no entanto, a minhota lutou muito e conseguiu ser 13ª, não desmerecendo. Ao invés, Albertina Dias, queixando-se de dores lombares (que a apoquentavam há já alguns dias), esteve muito mal na final. Andou sempre a meio da classificação mas começou a ceder aos 5.000 metros. Ultrapassada por Conceição Ferreira, desistiria logo a seguir, à passagem do sexto quilómetro.
A PROVA
“Não pensava ir para frente tão cedo. Esperava que a Elana Meyer aguentasse mais tempo. Calculava só comandar nos últimos dois a três quilómetros”
“Só me custaram os últimos 1.000 metros. O João Campos dizia para eu sair, eu tentava mas ela respondia sempre…”
“Eu sabia que estava bem, mas também sabia que a Tulu era bastante rápida. Nos últimos 300 metros passou-me pela cabeça que podia perder”.
João Campos, o treinador
O SOFRIMENTO E OS RECEIOS…
. Sofrimento: “Sofri muito, o dia todo, desde o pequeno-almoço – que não consegui tomar – até à reta final! Eu estava muito mais nervoso que ela e até me cheguei a preocupar com o à vontade incrível com que ela estava. Mas ainda bem que fui eu a ficar nervoso…”
. A prova: “Eu terei errado a dada altura. Quando a Elana Meyer atacou aos três quilómetros e apenas a Fernanda respondeu, deveria ter-lhe dito para a ajudar, de forma a não permitir que a Derartu Tulu recolasse. Mas joguei pelo seguro. Embora receando sempre a ponta final da etíope. Mas eu também sabia que a Fernanda estava muito forte no final. Num dos últimos treinos em Portugal, fez a 20ª série de 400 metros para 62,8. E com a vontade de ganhar que ela tinha…”
. Receio: “A mil metros da meta, tive muito receio. Antes, ela tentara isolar-se algumas vezes e não conseguira. Nessa altura, tive medo e aconselhei-a mesmo a resguardar-se um pouco para a reta final. E a última volta foi mesmo um suplício para mim…”
A FRASE
“As chinesas? Acho que o sangue de tartaruga já acabou…”
O PÓDIO
“É algo que não se consegue explicar. Creio que só não chorei porque já tinha chorado tudo ontem. Depois da prova, senti como que o coração apertado. Hoje, também senti esse aperto. As lágrimas estavam para saltar mas aguentei…”
10.000 m (9-8):
1ª Fernanda Ribeiro (POR) 31.04,99
2ª Derartu Tulu (ETI) 31.08,10
3ª Tecla Loroupe (QUÈ) 31.17,66
4ª Maria Guida (ITÁ) 31.27,82
5ª Elana Mayer (AFS) 31.31,96
6ª Liz McColgan (GBR) 31.40,14
7ª Alla Zhilyayeva (RÚS) 31.52,15
8ª Hiromi Suzuki (JAP) 31.54,01
9ª Annemari Sandell (FIN) 31.54,29
10ª Kathrin Wessel (ALE) 31.55,04
11ª Liève Slegers (BÉL) 32.10,59
12ª Lynn Jennings (EUA) 32.12,82
13ª Conceição Ferreira (POR) 32.14,69
14ª Anne Marie Lauck-Letko (EUA) 32.22,54
15ª Jill Hunter (GBR) 32.24,93
16ª Junko Kataoka (JAP) 32.45,43
17ª Marleen Renders (BÉL) 32.47,46
18ª Getenesh Wami (ETI) 32.56,94
Albertina Dias (POR) desistiu
Yvonne Murray (GBR) desistiu